Em Maio de 2007 escreveu isto:
A notícia do internamento hospitalar do Eusébio foi das
maiores surpresas da minha vida. A doença não é coisa que normalmente
associemos à divindade, daí que a arteriosclerose do Pantera Negra me tenha
apanhado desprevenido. Se até o Eusébio adoece, que esperança resta a mortais
como nós? Como tudo o que é inesperado, a doença do Eusébio fez-me pensar, e o
leitor sabe bem como os factos que me fazem pensar merecem celebração, quanto
mais não seja pelo respeito que é devido aos acontecimentos raros. Em Portugal,
temos o hábito de esperar que as pessoas morram para as homenagearmos, altura
em que a homenagem, parecendo que não, é apreciada com menor entusiasmo. No
caso das pessoas que vivem para sempre, como o Eusébio, as homenagens correm o
risco de ficar adiadas indefinidamente. Por isso, enquanto é tempo, presto a
minha homenagem a Eusébio da Silva Ferreira, antes que seja tarde e eu morra
sem conseguir fazê-lo. Se o que digo enquanto vivo faz pouco sentido, calculem
como serei incongruente depois de defunto.
A minha admiração pelo Eusébio nasceu num momento
particular. Eram os últimos minutos da final da Taça dos Campeões de 1968, e o
jogo estava empatado entre o Manchester United e o Benfica. Mesmo no fim,
Eusébio aparece à entrada da área dos ingleses com um adversário de cada lado.
Naquele tempo, as regras do futebol eram quase iguais às de hoje: injustas. As
equipas eram obrigadas a jogar com apenas onze jogadores de cada vez, mesmo que
do outro lado estivesse o Eusébio. A desproporção de forças era gritante. Era
óbvio para todos que, só com três adversários pela frente (contando com o
guarda-redes), Eusébio ia marcar.
O Pantera Negra não desiludiu ninguém: deixou os defesas
para trás como sempre, e depois fez o gesto de sempre e chutou com a força de
sempre. Estava lá dentro, e o Benfica seria campeão da Europa pela terceira
vez. Era impossível que o guarda-redes apanhasse aquela bola.
E, no entanto, apanhou-a.
Quando percebe que o guarda-redes lhe tira a oportunidade de
fazer o golo decisivo nos últimos minutos da final da Taça dos Campeões
Europeus, qual é a reacção de um jogador? Grita? Pragueja? Chora? Insulta o adversário?
Insulta a bola? Insulta-se a si mesmo? Provavelmente, faz tudo isso e ainda
arranca cabelos. O que fez Eusébio? Foi ter com o guarda-redes e
cumprimentou-o. E depois aplaudiu a defesa. O Eusébio era aquilo tudo que toda
a gente admira: os golos do meio campo, as arrancadas a deixarem todos para
trás, a força sobre-humana, a velocidade incrível. Mas era também aquele
cumprimento e aquele aplauso a um simples humano que se tinha transcendido a
ponto de o conseguir parar. De entre todos os deuses que a Humanidade inventou,
desde o início dos tempos, não sei se haverá muitos que reúnam tantas
qualidades como o Eusébio.
Tantas palavras para deixar aqui escrita a minha opinião
sobre ele quando ela se reduz a duas linhas: Eusébio é outra maneira de dizer alegria.
Eusébio é outra maneira de dizer Benfica. São dois favores que eu agradeço.
Obrigado, King. Via
Visão
Ontem falou assim:
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